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segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

Deixando 2019...


Chegou aquele momento de fazer minha lista dos melhores do ano (considerando os que eu consegui ver, claro):


01. Entre Facas e Segredos
02. Coringa
03. Vingadores: Ultimato
04. Toy Story 4
05. Vidro
06. Parasita
07. Star Wars: A Ascensão Skywalker
08. Dois Papas
09. O Irlandês
10. Era Uma Vez... em Hollywood


Se fosse para considerar também os de 2018 que foram lançados aqui no Brasil somente em 2019, a lista ficaria assim:

01. Entre Facas e Segredos
02. Homem-Aranha no Aranhaverso
03. Vice
04. Green Book: O Guia
05. Coringa
06. Vingadores: Ultimato
07. Toy Story 4
08. Vidro
09. Parasita
10. Star Wars: A Ascensão Skywalker


NOTA: o melhor filme do ano, de verdade, foi The Farewell, só que ele não foi lançado por aqui ainda (nem sequer tem título nacional oficial até o momento), então tecnicamente não pode entrar nessa lista...


sábado, 28 de dezembro de 2019

Papas e Noel



Os Dois Papas é um excelente filme quando está com Anthony Hopkins e Jonathan Pryce em tela (ou mesmo com apenas um dos dois), entregando atuações impecáveis através de diálogos afiados, divertidos e também profundos - mesmo que, é de se imaginar, improváveis em alguns momentos. Por outro lado, é um filme fraco quando gasta seu tempo com os flashbacks que, ainda que iluminem um pouco o passado de Francisco, destoam do resto do filme e trazem uma carga partidária desnecessária. Mesmo quebrando a regra "mostre, não conte", o resultado seria bem mais interessante se Fernando Meirelles continuasse com sua câmera apontada para as reações de Pryce narrando e de Hopkins ouvindo.

Dois Papas (The Two Popes), 2019






Buscando reinventar as origens do Papai Noel (e de todos os detalhes em torno do seu imaginário) de uma forma realista, mas não sem a magia do espírito natalino, Klaus é mais uma daquelas gratas surpresas que a Netflix "tira da manga" de vez em quando. Com uma animação de encher os olhos, está criado mais um programa agradável para se assistir recorrentemente com toda a família aos finais de ano.

Klaus (Klaus), 2019




sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

O Encerrar da Força


Eu nasci com três meses de separação do lançamento do, então, Guerra nas Estrelas, portanto desconheço um mundo onde Star Wars não exista. Assim como para a maioria dos amantes de cinema, é praticamente impossível para mim uma reação não passional aos produtos da franquia. Após ter vivido muitos altos e alguns severos baixos tão intensamente e por tanto tempo, a emoção fala mais alto e a razão é sufocada em meio ao enaltecimento das coisas boas ou com a potencialização das partes ruins, dependendo do momento do relacionamento.


Após me empolgar com O Despertar da Força e aplaudir e defender Os Últimos Jedi, tentei chegar imparcial a A Ascensão Skywalker. Se as críticas gerais e os comentários de algumas pessoas próximas são indícios, eu não consegui. É bem claro para mim que o filme é longe de perfeito, possui uma quantidade grande de qualidades e tudo aquilo que faz Star Wars ser o que é, mas tem também uma quantidade proporcional de defeitos e de pontos aos quais os detratores podem se apegar. Minha experiência pessoal e genuína (sabe-se lá se tendenciosa, bem no fundo) foi: me comovi e me diverti com as partes boas e não me incomodei com as partes ruins.

Mesmo que J.J. Abrams não tenha sido tão ousado quanto Rian Johnson, não acho que tenha tentado "corrigir" alguns aspectos criticados (erroneamente) no capítulo anterior. Pelo contrário, Abrams demonstra respeito (e reverência) a tudo que veio antes e consegue cumprir com sucesso a dificílima missão de concluir de forma satisfatória essa saga de seis (tá, nove) filmes.

No "ame-o ou deixe-o", fico com o "ame-o". E para a turminha chata que deve estar organizando (mais uma) petição on-line contra o filme, fica a dica: "deixe-o". O ódio é o caminho pro Lado Sombrio.


Star Wars: A Ascensão Skywalker (Star Wars: Episode IX - The Rise of Skywalker), 2019




quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Adão Motorista

A uma semana da estreia de seu retorno ao papel de vilão de uma certa sagazinha galáctica aí, vamos dar uma recapitulada no ano atarefado de Adam Driver:



Mal começou a temporada de premiações e História de um Casamento já nasceu sob os holofotes. Com atuações impecáveis e um roteiro afiado, esta história de um divórcio, na verdade, é ao mesmo tempo triste e engraçada, meiga e agressiva, acessível e intangível. Tenta se posicionar como uma visão imparcial, sem mocinhos e vilões, certo ou errado, mas não consegue eliminar minha impressão de que a perspectiva feminina aqui é, em essência, através de uma ótica masculina (es)forçadamente empática. Ter uma mulher como corroteirista no projeto, como foi feito em Antes da Meia-Noite, por exemplo, teria sido muito mais honesto.

História de um Casamento (Marriage Story), 2019






Embora não consiga ser tão tenso ou dramático quanto outros thrillers políticos, O Relatório é um filme sólido e inquietante que nos leva, de uma maneira bem crua, aos bastidores das investigações do Senado americano sobre os métodos avançados de interrogação de prisioneiros (tortura, mesmo) da CIA durante a guerra ao terror após o 11 de Setembro. São nove anos do processo de criação de um relatório de mais de seis mil páginas condensados em uma narrativa de duas horas que, francamente, parecem se esticar em umas três.

O Relatório (The Report), 2019





Jim Jamursch é um cineasta peculiar que deixa suas excentricidades transparecerem nas suas obras. Com Os Mortos Não Morrem eu não esperava nada diferente, pelo contrário, tratando-se de uma comédia de terror sobre zumbis, eu contava com isso. Porém, com a liberdade criativa e a falta de compromisso que o rótulo de "estilo filme B" traz, Jamursch se excede e se perde. O elenco estelar é mal aproveitado e o roteiro mira muitos estilos de comédia diferentes, mas, acertando aqui e ali aleatoriamente, acaba resultando num filme sem identidade. Memorável mesmo só a música-tema, mas talvez mais por insistência do que por mérito.

Os Mortos Não Morrem (The Dead Don't Die), 2019




domingo, 8 de dezembro de 2019

De facas a balas



Ao mesmo tempo em que homenageia (tanto com referências bem sutis, quanto com citações descaradas) as histórias de assassinato/ mistério, o diretor-roteirista Rian Johnson também consegue subverter um pouco o whodunnit com o divertido Entre Facas e Segredos. Um elenco de peso, todo inspirado, conduz esta trama à moda antiga, mas, passada nos dias atuais, cheia de atualidades (tecnológicas e temáticas). Não que suas reviravoltas sejam lá tão surpreendentes, mas há pouco o que se dizer sobre a produção sem entrar em território de spoiler. A dica é: corra para o cinema para se deliciar com um dos melhores filmes do ano.

Entre Facas e Segredos (Knives Out), 2019






"It's what it is." Esta frase já icônica de O Irlandês também define a própria produção da Netflix. Martin Scorsese juntando Robert De Niro, Al Pacino e Joe Pesci no tipo de filme que eles praticamente modelaram não tem erro e o resultado não é outro: é o que é. Scorsese é um mestre em filme de máfia/ gângster e aqui esbanja toda sua habilidade. De Niro e Pacino parecem estar em automático, tamanho o conforto com o tema e a ambientação - mas, mesmo o automático destes já é superior ao esforço árduo de tantos outros. Somente Pesci, em pausa na aposentadoria após insistência de Scorsese, parece cansado, desmotivado, sem vontade de dar uma bela atuação. Em uma análise fria, o longa também traz pouca, se alguma, novidade ao gênero, sendo seu ponto forte (todos os envolvidos estarem na sua zona de conforto), também seu ponto fraco. E, convenhamos, dava fácil para dar uma bela reduzida nestas três horas e meia de duração.

O Irlandês (The Irishman), 2019




quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Hollywood segundo Tarantino


Atenção - este texto contém SPOILER!

Qualidades que ninguém (nem eu, “anti-fã” confesso do cara) pode negar em Quentin Tarantino são seu vasto conhecimento de, e sua paixão ardente por, cinema. E Era Uma Vez... em Hollywood é sua obra em que estas marcas estão mais transparecendo e são mais bem aproveitadas. Sem dúvida, uma carta de amor (amor verdadeiro, com as partes amargas inclusive) para uma era rica do cinema e que tem como destinatário qualquer entusiasta da sétima arte.

Porém, é fácil enxergar como que este pode ser um filme com pouco alcance. O roteiro não faz esforço algum para estabelecer um “quem era quem” dentre os ‘personagens reais’ e nem para situar o público. Mesmo os personagens fictícios têm pouca construção, sendo boa parte do filme um simples convite para umas voltas por um pedaço da história da cultural mundial (com caracterização e ambientação muito bem feitos) acompanhando dois caras carismáticos (e com os conhecidos e talentosos DiCaprio e Pitt na tela fica fácil ser preguiçoso no papel).


Nas duas primeiras horas de projeção, as Tarantinices estão quase todas lá, exceto pela violência gráfica com viés cômico (é um humor de gosto específico, ou de mau gosto como muitos apontariam, mas é o que é). Fica um incômodo porque a expectativa da chegada da sanguinolência inevitável fica conectada ao suspense cultivado pela subtrama que envolve Sharon Tate e os seguidores de Charles Manson. Mas, aqui também Tarantino é displicente e depende fortemente que o público tenha conhecimento prévio de fatos verídicos. Se fosse uma narrativa 100% fictícia, seria imperdoável a forma como o clímax é tirado da manga com tão pouca motivação ou preparação. Os próprios “vilões da história” são pintados meramente como uns hippies bobões que atendem às ordens de um Charlie qualquer.

Embora eu tenha genuinamente gostado de quase todo o (longo) filme e sua visão sobre os bastidores de Hollywood, o desfecho me deixa com sentimentos ambíguos. Consigo entender que Tarantino usa sua fábula (“Era uma vez” de novo) para dar aos Mason o que eles mereciam pelas atrocidades cometidas contra Tate e seus amigos naquela noite macabra (e dar a Sharon a oportunidade de seguir com sua carreira e sua vida). Mas, ao mesmo tempo, ele repete exatamente o que eu não gostei em Bastardos Inglórios (simplesmente defenestrar a História) e em Oito Odiados (não conseguir concluir um filme sem marcar ‘banho de sangue’ no seu checklist de marcas registradas). Não consigo imaginar como podem se sentir as pessoas próximas das vítimas com a conclusão escolhida (então se um dos amigos de Polanski fosse um fodão com um cachorro treinado teria sido tudo tranquilo?). É simplista demais e não traz conforto algum. Mas, Tarantino nunca está preocupado com os outros. A catarse do seu filme é só para si próprio.

PS.: para uma homenagem à Hollywood dos anos 50, mais honesta e menos pretensiosa, mas não com menos visão, estilo próprio e humor peculiar, recomendo Ave César!


Era Uma Vez... em Hollywood (Once Upon a Time... in Hollywood), 2019




sábado, 23 de novembro de 2019

Livro - Sessão de Gestão


Reflexões galácticas sobre gestão em Star Wars? Lições ocultas de empreendedorismo em Caça-Fantasmas? Dicas atemporais de gerenciamento em De Volta Para o Futuro? Ensinamentos mágicos sobre administração em Harry Potter?

É buscando por indícios de vida corporativa na sétima arte que esta compilação de textos curtos e, na medida do possível, descontraídos reforça conceitos do dia-a-dia de projetos, à luz do imaginário das telonas.

Mescla de algumas publicações que realizei de 2015 a 2017 no portal PMKB com outros textos ainda inéditos, o livro se define como qualquer coisa entre 'gestão de projetos para leigos que gostam de cinema' e 'cinema para leigos que gostam de gestão de projetos'.



Onde comprar:



quarta-feira, 20 de novembro de 2019

Monstros: os de dentro, os de fora e os literais



Até pouco antes do ato final de seu primeiro episódio, Years and Years parece uma ser um drama familiar comum, com uma boa produção e atuações de primeira. Mas, a partir daí eventos de proporções globais começam a afetar o cotidiano dos protagonistas, que passam a enfrentar seus próprios demônios em um mundo cada vez mais insano. Sem exageros ou avanços futurísticos impalpáveis, a (mini)série navega por temas tão próximos  e atuais, que fica difícil de rotulá-la como distópica.

Years and Years (1 temporada), 2019






Só de assistir a primeira temporada de Fleabag, talvez não seja possível entender tamanha comoção pela série escrita e estrelada por Phoebe Waller-Bridge. Mas, nos quase três anos que separaram a primeira da segunda, parece que a britânica aprendeu a podar o que não funcionou tão bem e amplificou na medida certo o que deu certo e voltou com a nova temporada beirando a genialidade. A quebra da quarta parede é um chame à parte e escancara a qualidade de Phoebe como atriz, em meio a um elenco todo excelente. Não bastasse isso, seu talento como roteirista é consagrado com diálogos afiados e arcos emocionalmente satisfatórios e honestos para seus personagens. Todos aqueles prêmios, amigos? Merecidíssimos.

Fleabag (2 temporadas), 2016-2019






Para não ficar de fora da onda de "todo mundo agora faz sua própria série de streaming",  o IMDB deixou sua contribuição com You´re Not a Monster. Contando com dez episódios com menos de 5 minutos de duração cada, a primeira temporada desta série de animação acompanha um psicólogo de monstros. Como ele mesmo deixa claro ao dispensar Dr. Hannibal Lecter - ele só cuida de monstros de verdade, não dos metafóricos. Zumbi, Múmia, Homem Invisível, Medusa e vários outros surgem sob trocadilhos e sacadas interessantes, mas no geral a ideia original é bem melhor que o resultado final.

You´re Not a Monster (1a. temporada), 2019




domingo, 17 de novembro de 2019

Expresso do oriente



Tão divertida quanto melancólica, The Farewell é uma pequena obra-prima que se despe de clichés para tratar choque cultural de forma respeitosa e delicada, criando empatia suficiente para que o público não consiga demonizar nenhum ponto de vista. Através de um roteiro inteligente e sincero e um elenco inspirado somos convidados a (re)pensar a forma como enxergamos a nossa mortalidade, como lidamos com determinadas mentiras, como anda nosso relacionamento com os parentes distantes. Alguns detalhes de bastidores (que devem ser pesquisados somente depois do término do filme) são a cereja no topo do bolo desta preciosidade.

The Farewell (ainda sem título em português), 2019








Vencedor da Palma de Ouro em Cannes este ano, Parasita é um filme estiloso sobre desemprego e classes sociais que diz muito sobre a Coreia do Sul, mas que também consegue ser universal. Pessoalmente, gosto mais dos dois primeiros atos do longa, pois o clímax promove uma escalada de violência que destoa do que vinha sendo construído. Porém, isto não diminui a obra, pois os gatilhos não surgem sem motivação. Não é spoiler citar uma frase que está no cartaz do filme, embora surja tarde na projeção: "O melhor plano é nenhum plano". O personagem que diz isto está deixando bem claro seu objetivo: apenas sobreviver a esta vida. Mas, é quando os personagens deixam de apenas querer sobreviver (por impulso de orgulho, de senso de justiça, de desejo pessoal) que tomam decisões que fazem as coisas desandar. E acabam não sobrevivendo ou tendo que se contentar a voltar a tentar sobreviver. Uma fábula moderna e perturbadora bastante relevante para a sociedade atual.

Parasita (Gisaengchung), 2019




quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Eu sei o que você fez no mês das crianças



Toy Story 3 fechou de forma emocional e emocionante uma trilogia que beirou a perfeição. Era consenso que não havia necessidade alguma de um quarto filme. Mas, a Pixar foi lá e fez mesmo assim, provando que o mundo inteiro estava errado. A nova aventura de Woody & cia navega por temas adultos, ao criar metáforas para paternidade e discutir existencialismo, mas nunca abandona sua natureza infantil, nem deixa a bola cair no quesito diversão. Toy Story 4 fechou de forma emocional e emocionante uma quadrilogia que beirou a perfeição. É consenso que não há necessidade alguma de um quinto filme. Mas, se a Pixar for lá e fizer mesmo assim, não tenho dúvida que irá provar que o mundo inteiro está errado.

Toy Story 4 (idem), 2019






É triste constatar como que O Menino Que Queria Ser Rei passou batido nos cinemas e não encontrou seu público nem depois que ficou disponível para consumo nos lares. Essa aventura infanto-juvenil enraizada na fantasia, com humor bem dosado e o coração no lugar certo, teria facilmente me conquistado (e milhares como eu) nos anos 1980. A culpa não é do estilo do filme, nem do tema, mas dos pais de hoje em dia, que não querem enxergar nada além do horizonte dos super-heróis. Meu filho, 8 anos, se empolgou, mas sem colegas com quem comentar e reviver a experiência, produções como esta serão esquecidas e se tornarão ainda mais raras. Lamentavelmente.

O Menino que Queria Ser Rei (The Kid Who Would Be King), 2019






A Turma da Mônica dispensa apresentações. Abraçando com força esta noção, Turma da Mônica: Laços não perde tempo com contextualização nem com introdução dos seus personagens. Só funciona para quem já conhece bem a turminha. Ainda assim, o roteiro traz uma caracterização pobre, principalmente de Magali, que não tem nada para fazer além de pontuar seu apetite eterno, e de Cascão, que nunca esboça o espírito piadista que possui nos quadrinhos e animações. O longa perde a oportunidade de inserir referências legais (uma aparição da Turma do Penadinho "real" no final da cena no cemitério seria genial). A trama principal é fraca, com um desfecho cheio de pontas soltas. Mas, também, quem se importa? Crianças assistem pelas tlavessulas e coelhadas, adultos pelo saudosismo. A mensagem é bonitinha e tudo certo.

Turma da Mônica: Laços (idem), 2019




sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Piada de duplo sentido


Quando surgiram as primeiras notícias sobre um filme solo de origem do Coringa, torci o nariz (e olha que é um nariz bem grande). Sempre achei que os grandes vilões são mais interessantes quando nós não sabemos de verdade quem são (um abraço para você, Darth Vader dos midchlorians vivos especiais). Uma das coisas que tornava o Coringa de Heath Ledger em Batman: O Cavaleiro das Trevas tão ameaçador era justamente isso. E cada vez que ele contava uma história diferente sobre a origem de suas cicatrizes, mais imprevisível ele se tornava.

Minha resistência ao novo Coringa foi caindo com o tempo, a cada nova notícia e com o Leão de Ouro em Veneza, a ponto de inclui-lo na minha lista dos mais esperados do ano. Consegui ir ao cinema livre de spoilers, mas não sem saber vários dos comentários que vinham surgindo.

"Não é um típico filme de super-herói". Definitivamente! "É um estudo de personagem, denso psicologicamente e violento". Sem dúvida. "A atuação de Joaquin Phoenix é fenomenal e digna de prêmios". Assino embaixo. "O filme não sabe lidar muito bem com seus temas e pode ser potencialmente perigoso". Talvez tenha havido alguns exageros nas reações, mas no geral, a afirmação está correta.


A verdade é que sem o pano de fundo já notório na cultura pop mundial, o público estaria diante de uma história desprovida de propósito. Coringa funciona bem quando se embasa ou faz referência ao universo de qual veio, mesmo com todas as liberdades e desvios. Se fosse sobre um palhaço chamado Carnaval, na cidade de Nova York, com um milionário chamado Taylor West, ficariam expostas as fragilidades da trama e os tropeços de roteiro.

De um desencadear de coisas que parecem vir mais ao acaso para o protagonista, em vez de acontecerem por causa de ações e decisões dele, até um discurso final deslocado, desnecessário e implausível que serve só para expor para o público os temas do filme, existem inúmeros pontos que não seriam perdoáveis em outras produções.

Mas a já mencionada atuação de Phoenix, a trilha sonora envolvente da islandesa Hildur Guðnadóttir (também ótima em Chernobyl), o investimento emocional e, mais uma vez, a graça (perdão da palavra) de ver a ambientação de parte do universo DC sob toda uma nova perspectiva, como nunca antes, nos levam a esquecer os deslizes do filme. O diretor, mais conhecido por Se Beber Não Case, surpreende e cria momentos memoráveis, incluindo uma cena que se torna instantaneamente clássica, pulando da violência gráfica para um misto de humor e tensão, que faria inveja em Quentin Tarantino.

!Agora não tem jeito de não entrar em spoilers!

Falando em referências, as duas mais óbvias e mais comentadas são as a Taxi Driver e a O Rei da Comédia. Mas, por várias me peguei pensando em Psicopata Americano. E aí entramos nas ambiguidades da obra.

A revelação de que o envolvimento de Arthur Fleck com a vizinha era apenas na sua cabeça reforça a teoria de que o caso de sua mãe com Thomas Wayne nunca existiu e que ele, Arthur, estaria tendo um distúrbio similar ao de sua mãe. Ainda assim, não é conclusivo. Particularmente, gosto mais da versão de que Arthur é filho de Wayne, que teria forjado e forçado um registro de adoção para Penny Fleck. Ironicamente, Wayne indiretamente criou o Coringa, que indiretamente criou o Batman.

Outro ponto em aberto, também reforçado pelo caso com a vizinha, mas levantado só no desfecho, é o de que tudo aquilo teria acontecido na imaginação de Arthur enquanto ele estava no hospício (remetendo ao agora suposto flashback no início do filme em que ele bate a cabeça repetidamente numa porta branca - e daí as pegadas de sangue no corredor na cena final). Esta é uma leitura plausível, pelo que é apresentado, mas que para mim diminui o filme drasticamente (e que me faz lembrar ainda mais do porquê não gostei de Psicopata Americano). Nesta versão, de que quase nada aconteceu de verdade, eu não gosto de Coringa.

!Fim de spoilers!

Mas, desconsiderando as interpretações que não me agradam, Coringa facilmente figura entre os melhores do ano, provando ser um daqueles raros feitos que mesclam bem a pegada artística com a cultura pop.


Coringa (Joker), 2019





sábado, 28 de setembro de 2019

Estrelas - das solitárias às esquecidas



Embora conte com algumas sequências tensas e mais aceleradas, Ad Astra - Rumo às Estrelas é em quase toda sua duração um drama intimista de ritmo lento, focado numa atuação contida de Brad Pitt. Isto, belas imagens e incontáveis enquadramentos em plano detalhe e primeiríssimo plano trazem um quê de Terence Malick para a obra. Mesmo com a falta de sutileza ao lidar com o tema pais e filhos e com a exposição recorrente (muitas vezes com uma narração desnecessária), o filme cumpre bem seus objetivos. Mas, teria me agradado muito mais se tivesse sido lançado antes de Gravidade, por alguns motivos, e de Interestelar, por muitos outros.

Ad Astra - Rumo às Estrelas (Ad Astra), 2019




 Por ser uma "história sobre a criação do Dicionário Oxford", O Gênio e o Louco me surpreendeu com uma dose inesperada de tensão, peso dramático e até violência. Sean Penn brilha mais uma vez e parece estar na maior parte do tempo em um filme diferente que o de Mel Gibson. Isto é devido não somente à disparidade da atuação marcante de Penn com a apagada de Gibson, mas também por más escolhas de roteiro e de edição, que deixam a produção com tom e ritmo irregulares.

O Gênio e o Louco (The Professor and the Madman), 2019




 Assistir Yesterday tentando achar uma lógica para sua premissa intrigante - que o mundo inteiro, exceto um músico fracassado, se esqueceu dos Beatles - é um esforço inútil. Assistir Yesterday esperando por coerência e explicações é uma empreitada frustrante. Yesterday tem que ser visto pelo que é: uma comédia romântica com um cenário inusitado e divertido, bem dirigida por Danny Boyle e escrita pelo mesmo cara de Um Lugar Chamado Notting Hill (e dá para perceber como temas e até cenas deste se repetem aqui). Let it be, porque all you need is love.

Yesterday (idem), 2019


quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Netflix para todo gosto (e mau gosto)




Ficção-científica pós-apocalíptica com ambiente restrito, elenco reduzido e que se lança em debates existenciais não é nenhuma novidade, nem uma tarefa fácil de se realizar bem. Mas, I Am Mother consegue prender a atenção, instigar e trazer um pouco de originalidade ao gênero. A dupla principal, a androide Mãe, uma ameaça latente por trás da serenidade aparente, e a humana Filha, vivida com talento pela jovem atriz dinamarquesa Clara Rugaard, conduzem a trama com uma dinâmica inquietante. Alvo de críticas de muitos, o final sombrio não me desagradou, sendo bem menos ambíguo do que julgam por aí.

I Am Mother (idem), 2019






 Após os primeiros minutos de Estrada Sem Lei, quando descobri qual era o enredo, me vi com um "problema de spoiler". A única cena que ficou comigo de Bonnie e Clyde - Uma Rajada de Balas, quando assisti ao filme décadas atrás, era a última. Mas, acabou que saber o desfecho não atrapalhou apreciar o que este longa da Netflix traz de melhor para a conhecida história da dupla de criminosos da Grande Depressão. A ambientação, a trilha sonora e, claro, as boas atuações de Kevin Costner e Woody Harrelson sustentam a produção que poderia muito bem ter tido um lugar nas salas de projeção.

Estrada Sem Lei (The Highwaymen), 2019






O problema raiz de The Perfection o é sua falta de identidade. O longa começa flertando com um thriller sexy sobre obsessão e no seu segundo ato ganha tons de terror B. Se essa transição bizarra já não ajuda muito, as coisas desandam ainda mais no terceiro ato, quando o roteiro não consegue se conter com mais uma reviravolta inadequada, tentando se firmar como um drama de vingança. E a verdadeira revelação é que a produção é infeliz e insensível ao escolher suas ferramentas para tratar de um assunto muito delicado e que merece mais cuidado.

The Perfection (idem), 2018