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quinta-feira, 27 de junho de 2019

Isso não é muito Black Mirror...


Se com a temporada anterior parecia que Black Mirror estava desbotando, com a mais recente parece que a série está brilhando. Mas, não no bom sentido.

Existem poucos resquícios da ironia, da acidez e da ambiguidade sombria que tanto marcaram os episódios mais inspirados da série. Como um Batman Eternamente para os filmes de Tim Burton,  não seria absurdo se esta curta temporada fosse rebatizada como Neon Mirror.

Os episódios de abertura e encerramento, Striking Vipers e Rachel, Jack e Ashley Too, trazem lá os tradicionais conflitos do comportamento humano com o perigo da tecnologia, mas acabam sendo otimistas demais (e cheios de gordurinhas). O primeiro parece mais preocupado em mexer com a percepção e conceitos do espectador do que contar uma história, enquanto o último tem a estrutura frágil e batida de uma novela mexicana, com os elementos de um conto-de-fadas.


Mesmo com uma mensagem muito direto ao ponto, como talvez Black Mirror nunca foi, o que salva é o episódio do meio, Smithereens. Boas atuações (bacana rever Andrew "Moriarty" Scott) sustentam a trama simples, mas bem construída com uma escalada envolvente de drama e tensão. E com um final, aí sim, mais blackmirroresco.

Mas então, excluindo o (telefilme? experimento?) Bandersnatch lançado ano passado, como as novas histórias se comparam com as demais? Por enquanto, na minha opinião, assim:

01. Toda a Sua História - The Entire History of You (T01, E03), 2011
02. Natal - White Christmas (Especial - T02, E04), 2014
03. San Junipero (T03, E04), 2016
04. Queda Livre - Nosedive (T03, E01), 2016
05. Smithereens (T05, E02), 2019
06. Metalhead (T04, E05), 2017
07. Engenharia Reversa - Men Against Fire (T03, E05), 2016
08. Hang the DJ (T04, E04), 2017
09. Odiados pela Nação - Hated in the Nation (T03, E06), 2016
10. Versão de Testes - Playtest (T03, E02), 2016
11. Manda Quem Pode - Shut Up and Dance (T03, E03), 2016
12. Crocodilo - Crocodile (T04, E03), 2017
13. USS Callister (T04, E01), 2017
14. Urso Branco - White Bear (T02, E02), 2013
15. Black Museum (T04, E06), 2017
16. Arkangel (T04, E02), 2017
17. Hino Nacional - The National Anthem (T01, E01), 2011
18. Volto Já - Be Right Back (T02, E01), 2013
19. Striking Vipers (T05, E01), 2019
20. Momento Waldo - The Waldo Moment (T02, E03), 2013
21. Quinze Milhões de Méritos - Fifteen Million Merits (T01, E02), 2011
22. Rachel, Jack e Ashley Too - Rachel, Jack and Ashley Too (T05, E03), 2019

A Netflix ainda não confirmou uma 6a. temporada. Se meu ranking é algum indício, tomara que não deixem de fazê-la, pois a série merece uma despedida melhor.


Black Mirror (5a. Temporada), 2019




segunda-feira, 24 de junho de 2019

E nós com isso?


(Texto com SPOILER e com sentido só para quem assistiu Nós (Us). Para quem gosta de terror fora do óbvio, recomendado assistir - antes de ler, obviamente)

O primeiro longa de Jordan Peele como diretor, Corra!, foi muito bem recebido e rendeu a ele inclusive um Oscar de Roteiro Original. Assim, a expectativa por sua obra seguinte, Nós, era alta e comparações com sua anterior acabariam sendo inevitáveis.

Mas, embora formem uma interessante "sessão dupla de filmes de terror não convencionais", elas não são tão parecidas quanto se poderia imaginar. Corra! mirava um escopo bem menor e, talvez por isto mesmo, tinha um foco maior e apresentava alegorias mais bem lapidadas. Mesmo tendo uma roupagem bem menos usual, enquanto Nós consegue ser vendido como terror de fato, Corra pedia menos 'suspensão de descrença' do espectador.


Quando chegamos ao clímax de Nós, uma série de questionamentos surgem, em desserviço à história: Exatamente todos 'de cima' têm um 'amarrado' embaixo? Como que um relacionamento 'espelho' embaixo necessariamente cria filhos fisicamente idênticos aos de cima? Tem túnel debaixo dos EUA inteiro? O que acontece quando os de cima viajam para fora do país? E quando chegam estrangeiros? Como os amarrados conseguiram tantos macacões vermelhos e tesouras idênticas? E por aí vai...

É preciso fazer muita vista grossa, mas se estivermos dispostos a dar um salto de fé, há muito o que curtir nesta produção assustadora, mas por vezes divertida, e repleta de metáforas. A começar pelo elenco, todo ele, inclusive os atores mirins. É uma lástima que filmes do gênero, e lançados tão cedo no ano, sejam esquecidos ou deliberadamente ignorados na temporada de premiações, porque Lupita Nyong'o merecia abocanhar todos de Melhor Atriz. Simplesmente incrível.

A narrativa em si prende e surpreende, mas o principal é que a trama é instigante e abre possibilidades para diversas leituras.  Há quem veja no simbolismo do vermelho uma alusão ao agora em baixa Partido Republicano dos EUA (US?) e suas causas pela minoria oprimida. Mas, quando a 'Adelaide de Vermelho' diz "Nós somos americanos", enxergo mais como "Nós somos alguém também."

Mais do que político, vejo o subtexto como social: um grito pelos desfavorecidos, subjugados ou esquecidos. E, o filme ressalta, não somente por consequência dos mais ricos, mas também pela classe média. Um "já parou para pensar que para ter a boa vida que você tem, pode existir um submundo de sofrimento por trás"? Um "já parou para pensar que uma outra pessoa qualquer, menos favorecida, poderia alcançar o mesmo que você, dadas as mesmas oportunidades"?

Independente de sua interpretação pessoal, ou mesmo se prefere só ficar com a superfície do filme, Nós ainda tem o mérito de tirar da manga uma reviravolta final, que é ao mesmo tempo deliciosa (pelo valor cinematográfico) e perversa (pela natureza dos fatos). Com a transição de uma Adelaide que vai manchando de vermelho sua roupa branca, revelando gradativamente sua real natureza, o filme nos faz questionar o que temos como valores, o que julgamos ser correto, e para quem e pelo que deveríamos torcer... Provocativo, como todo bom terror é.


Nós (Us), 2019


terça-feira, 4 de junho de 2019

Pontos finais



Depois de 12 temporadas de uma boa mistura de sitcom tradicional com muita nerdice, Big Bang Theory chegou ao final se não com uma explosão, ao menos com a devida emoção. Assim como foi com (a superior, é verdade) Friends, o charme residiu em acompanhar o grupo de amigos: seus relacionamentos, seus maneirismos, seus sucessos, seus fracassos e sua evolução. O fim não deixa de ser agridoce, pois é impossível se livrar do sentimento de despedida definitiva. Mas, se paro de zapear toda vez que Chandler, Monica, Rachel, Ross, Phoebe e Rachel surgem na tela, sinto que o mesmo vai acontecer com Sheldon, Amy, Leonard, Penny, Raj, Howard e Bernadette. Com prazer.

The Big Bang Theory (12 temporadas), 2007-2019






Já com um pouco de saudade de Game of Thrones e acostumado com o padrão dos especiais sobre bastidores da TV e do cinema, sentei para ver The Last Watch com nenhuma expectativa, além da de revisitar alguns cenários e atores da série da HBO. Mas, os realizadores surpreenderam positivamente ao optar por seguirem "personagens" mais empatizáveis, mas não menos interessantes, do cotidiano da produção, em vez de entregarem um amontoado de depoimentos de astros do primeiro escalão. Divertido e até emocionante, este documentário é obrigatório para todos que acompanharam a saga de Westeros: os que gostaram e os que absurdamente acham viável fazer uma petição pedindo toda uma nova última temporada.

Game of Thrones: The Last Watch (HBO), 2019






Dentre as sugestões sem noção que ouvi dos que odiaram o desfecho de Game of Thrones, uma se destacou: "Por que não lançaram uns cinco ou seis finais diferentes?" Minha reação de "E quem escolheria o final, VOCÊ???" saiu filtrada na forma de "Você já assistiu Bandersnatch?". A questão é que o episódio especial da cultuada Black Mirror parte de uma ideia genial, em teoria, e que só pôde existir neste formato (comum em games e até na literatura) graças à Netflix, ao streaming. Ao tomar decisões respondendo perguntas simples que surgem em tela, o espectador influencia diretamente os rumos que a história vai tomar. Apesar de se enveredar por uma metalinguagem curiosa, a fórmula de  Bandersnatch cansa rapidamente, justamente por não fornecer um senso de propósito. E de conclusão. Se não ficar satisfeito com final que acabou de assistir, você pode continuar "tentando" até ver quantos outros finais quiser. O resultado está mais para um experimento sem identidade, que sequer consegue fomentar as discussões filosóficas típicas de um pós-episódio de Black Mirror.  Diga o que quiser sobre os destinos de Cersei, Daenerys, Bran ou Jon: te garanto que Game of Thrones com cinco ou seis finais à la carte seria infinitamente pior.


Black Mirror: Bandersnatch (Netflix), 2018




sábado, 1 de junho de 2019

Raios!



Com pouquíssimo conhecimento sobre o universo Pokemón (um papo ou outro sobre o assunto com meu filho, a assimilação de que o mais importante é o amarelinho, e ícone pop, Pikachu e que seu poder maior é soltar raios pelo rabo - graças a um clipe alternativo do John Ulhoa), não precisa ser investigador  para afirmar que eu não sou o público alvo de Detetive Pikachu. Todavia, mesmo indo ao cinema só para tentar ser um bom pai, não fiquei entediado. Aliás, posso admitir que até gostei. Certamente a produção é um prato cheio para fãs, cheia de detalhes e referências, mas ainda apresenta uma base mínima para engajar os marmanjos. O visual do filme como um todo é bem cuidado e os monstrinhos são bem feitos. Se o recente (e merecidamente execrado) trailer de Sonic - O Filme é exemplo, ser "bem feito" ainda é um elogio hoje em dia e não algo óbvio. Em termos de roteiro, há furos por todos os lados. Só que não deixa de ser uma boa iniciação para os pequenos em filmes noir e em reviravoltas.

Pokémon: Detetive Pikachu (Pokemon Detective Pikachu), 2019






(Contém SPOILERS de Shazam!)
Talvez pelo já bastante criticado tom sombrio de vários dos filmes mais recentes da DC, a campanha de marketing de Shazam! investiu pesado no lado cômico da produção. E nada do que foi previamente divulgado nos prepara para os momentos mais pesados do filme. Não me refiro nem à violência, típica de quadrinhos, principalmente envolvendo os monstros que personificam os sete pecados capitais, mas às decisões do roteiro em trazer uma crueldade realista para seus personagens. Estamos falando de um filme que abre com um menino sofrendo bullying de seus próprios pai e irmão, que vem a crescer e se tornar o vilão que acaba matando os dois. Sem falar no arco do protagonista, que passa a maior parte do longa na busca por sua mãe, só para no clímax encontrá-la e ouvir secamente da sua boca que ela não o perdeu quando criança, mas simplesmente o abandonou. No entanto, na maior parte de sua duração, o filme cumpre o que promete (e ali tem seus melhores momentos) sendo essencialmente uma comédia, por vezes quase besteirol, que chega até a lembrar a série oitentista Super-Herói Americano, em que um adulto imaturo tenta descobrir e controlar seus novos superpoderes. O que distrai um pouco é que, ao contrário de tantas outras produções com a situação de "mesmo personagem, corpo diferente", o divertido Shazam adulto de Zachary Levy não se parece nem um pouco (comportamento, temperamento, etc) com o retraído adolescente Billy Batson.

Shazam! (idem), 2019







Quando Shrek 2 foi lançado, três anos depois do seu antecessor, já não existia mais o frescor da novidade e havia pouco a se acrescentar nos cruzamentos malucos dos personagens de vários contos de fadas. A continuação estava alicerçada meramente no peso dos seus já icônicos protagonistas. Uma Aventura Lego 2 sofre dos mesmos males que Shrek, com um agravante. Embora o primeiro filme e seu spin-offLego Batman: O Filme, tenham sido muito bons, seus protagonistas não conquistaram relevância cultural o suficiente para carregar um longa inteiro nas costas. Assim, a produção tem lá seus momentos divertidos, suas sacadas, suas referências, mas ironicamente ecoa a nova canção principal: "nada é tão incrível"...

Uma Aventura Lego 2 (The Lego Movie 2: The Second Part), 2019