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quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Na lista negra


A premissa de Death Note é instigante: e se um ser humano ficasse de posse do caderno de uma entidade da Morte, no qual as pessoas cujos nomes fossem escritos em suas páginas seriam mortas? Porém, o que poderia ser uma engajada e sombria discussão sobre moral e poder, na verdade é um filme policial bobinho com toques de terror. Não li nem assisti aos cultuados mangás/ animes/ filmes japoneses que precederam esta adaptação americana bancada pela Netflix, mas consigo pressentir que os fãs dos originais devem estar decepcionados.

O filme passa correndo por seus temas, apresentando mortes gráficas (que parecem saídas diretamente da franquia Premonição), até uma correria literal – uma perseguição a pé no terceiro ato que logo se torna repetitiva e que culmina em um diálogo que só serve para “entregar” o protagonista no desfecho da história. Muita coisa parece cair do céu, como o próprio caderno da morte, e fica a nítida impressão de que o roteiro não soube alocar no tempo restrito de um longa-metragem tudo o que queria trazer à mesa.


Qual é a de Ryuk e as maçãs? Qual é a de L e os doces? Qual é a de Watari e o papo do sono? Qual é a da antiga sociedade secreta que transformava órfãos em ultrasherlockholmeses modernos? As ações de Kira, que deveriam dar o devido peso à história, são resumidas em uma montagem que não deixa transparecer seu escopo nem a passagem de tempo. As próprias regras de uso do caderno (e parece haver dezenas delas)  vão surgindo e sendo pinceladas por conveniência.

O ator principal, que prova ser fraco desde seus primeiros gritos histéricos forçados após encontrar com Ryuk (este com aspecto realmente assustador e bom trabalho de voz de William Dafoe), não traz credibilidade nem ao romance central, reforçado pela falta de química com a parceira de cena. Ambos protagonizam uma das trocas de “eu te amo” mais chochas da história do cinem... ehrrr... das produções originais de provedores de streaming.

O diretor Adam Wingard até emprega um estilo interessante e acerta em várias composições visuais, mas não consegue ajustar o tom de sua obra. Um reflexo disto é a incompreensível inclusão de imagens de bastidores nos créditos finais. Como em uma comédia, ali também estão pequenos erros de gravação. Isso porque os maiores erros de gravação já vinham sendo apresentados ao longo dos 100 minutos anteriores.


Death Note (Death Note), 2017




sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Volume 2 do Vol. 2


Mais de uma pessoa (e duas já são muito aqui pra este blog, rsrs) me questionaram porque eu praticamente só escrevi coisa boa sobre Guardiões da Galáxia Vol. 2, mas dei "apenas" 3,5 como nota. Bom, antes de mais nada, esclareço que 3,5 já é mais que "bom". Agora, o lance é que os pontos negativos estavam basicamente inseridos em contexto de spoilers e eu tento evita-los ao escrever.

Mas, já que insistem, vamos lá...

(A partir de agora, alerta: SPOILERS para o filme)


O primeiro ponto que me incomodou foi influenciado por uma questão pessoal, de momento. Sei que não é profissional deixar situações externas alterarem a percepção e, ultimamente, a análise da obra, mas... eu não sou profissional do assunto. Rsrsrs.

Eu já tinha exposto no post original que o drama do filme se baseava "principalmente em defender que pais são péssimos". Eu assisti ao filme poucos dias após o dia dos pais, em uma semana em que eu estava longe dos meus filhos, a trabalho. Guardiões 2 tem (ou menciona) apenas dois pais -Ego e Thanos- e ambos são simplesmente os piores pais do mundo. Da galáxia, quer dizer. Não funcionou pra mim. Pais e filhos por aí mereciam um pouquinho mais.

Os outros pontos giram em torno do vilão Ego.

Para começar, ele surge em um momento muito oportuno, como uma demanda de roteiro e não algo lógico na trama. Por que ele não surgiu no momento crítico ao final do Guardiões "Vol.1", por exemplo? (A resposta é porque Kurt Russel não estava contratado e nem sabiam que o filme ia fazer sucesso e ter uma continuação).

Ele se diz uma Divindade (ou algo assim) e estava procurando por Peter Quill há muito tempo. Esse cara ia sofrer com Onde Está Wally?. No Guardiões "Vol.1", o Senhor das Estrelas era mega-conhecido e procurado, até deu entrada oficial em presídio intergaláctico e tudo mais.

Toda aquela cena de Ego explicando o passado para Peter através de uma espécie de museu de cera animado é bem ruim. Desnecessariamente expositiva e sem sentido dentro da realidade da história. E o fato de ele ter causado a morte da mãe de Peter, e como causou, não foi um artifício de bom gosto para "vilanizá-lo" .

Por fim, a sequência final do filme expõe claramente como que os realizadores não estavam preparados para lidar com o escopo que prepararam: o indivíduo É o planeta em que os personagens estão e, só para citar um exemplo, precisa de criar tentáculos para lutar contra eles??

Taí. 3,5 padecinhos tá justo, sim.

terça-feira, 22 de agosto de 2017

É melhor guardar do que vingar


A cena de abertura de Guardiões da Galáxia, com o protagonista em uma missão num planeta desconhecido dançando ao som dos anos 80, servia para já avisar: mesmo sob a marca da Marvel, aquele era um filme com espírito e estilo bem diferentes dos filmes de heróis até então. Grata surpresa, na verdade nem era um filme de super-heróis: estava muito mais para uma aventura espacial recheada de humor. Mesmo tendo se passado só três anos de lá pra cá, quem o assistiu só uma vez pode simplesmente ter se esquecido do clima diferenciado criado pelo diretor-roteirista James Gunn. Mas, Guardiões da Galáxia Vol. 2 apresenta, novamente, uma abertura que já joga o espectador na sintonia correta.


A sequência dos créditos iniciais desta continuação, que também traz um protagonista dançando ao som dos anos 80 durante uma missão num planeta desconhecido, é tão inventiva, divertida e cativante que chega a deixar a plateia até preocupada com o restante do filme – não tem como manter este ritmo e ser tão bom assim por mais duas horas. Mas, Guardiões 2 não deixa cair o nível da ação e da descontração durante toda sua duração. É impossível não gargalhar várias vezes, sozinho ou junto com Drax.

A produção também consegue investir no drama, proporcionando uma faceta emocional inesperada e bem-vinda, mesmo que se baseie principalmente em defender que pais são péssimos e que é melhor fazer dos amigos a família. Causa estranheza também que a dose de violência esteja um pouco acima dos padrões Disney-Marvel e, talvez, no limite da indicação etária. A recompensa é que as cenas mais intensas são criadas com imagens “quadrinhescas” com uma estética de se admirar.

O ponto extra para Guardiões é ter se sustentando até aqui sem as muletas do Universo Cinematográfico da Marvel. Há espaço (sideral) de sobra (e as várias pequenas pontas abertas no final são indícios disto) para que seus personagens principais e secundários continuem sendo desenvolvidos sem a necessidade de participações de Homem de Ferro & cia. Fica a torcida para que a confirmação da presença de Peter Quill e sua gangue no próximo filme dos Vingadores não force atos recíprocos para Guardiões Vol. 3.


Guardiões da Galáxia Vol. 2 (Guardians of the Galaxy, Vol. 2)




quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Avalanchezinha


Se não fosse pelo burburinho que causou no festival de Sundance, talvez Operação Avalanche não teria entrado no meu radar. Se não fosse pelo tema, a suposta encenação em estúdio da chegada do homem à Lua, talvez eu não o teria assistido. E talvez teria sido melhor assim.

O primeiro problema desta produção independente é o estilo: câmera na mão. Ainda não consigo deixar de ficar (mesmo que ligeiramente) nauseado com este desnecessário formato. Neste caso, ele poderia até ser justificável já que o filme se posa como um documentário perdido da época do programa Apollo. Mas, como todos sabem que ele é falso, filmá-lo assim pouco contribui e só faz evidenciar de que trata-se de um filme barato (sem conotações pejorativas). Sua artificialidade se dá não somente por ser notório que os atores são contemporâneos nossos, mas também porque já está muito fora de moda duvidar de que o homem foi à Lua. (Se ainda há algum pingo de vontade de abraçar teorias da conspiração, recomendo o curto e ótimo episódio 199 do Nerdologia no YouTube).


Falando em atores, eles são a raiz do segundo problema. Matt Johnson pode ser um bom diretor, mas como ator é só irritante. Os protagonistas eram para ser uma dupla de agentes da CIA infiltrados na NASA se passando por estudantes de cinema. Mas, mesmo fora do disfarce eles parecem o tempo todo ser o que são na vida real: estudantes de cinema. Ninguém ali convence e a jornada parece existir só para se apreciar um bom trabalho amador. Se os realizadores fossem da família, ou amigos íntimos, seria uma experiência excelente, mas a obra exposta para o mundo pouco tem a agregar.

Apesar do roteiro fraco, que para um pseudo-documentário traz pouca lógica e coerência, há o que se apreciar no filme, especialmente nas passagens envolvendo o cineasta Stanley Kubrick à la Forrest Gump. Mas, no fim das contas é somente mesmo uma ótima ideia executada com boas intenções. E sabe o que dizem por aí sobre boas intenções, né?


Operação Avalanche (Operation Avalanche), 2016




sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Saul que há de melhor


Continuo sendo o (desacreditado) cara que se diz fã de cinema e que nunca viu Breaking Bad. O problema é que perdi o zeitgeist da série protagonizada pelo famoso Walter White e acabei traçando uma meta: assistir ao seu spin-off, Better Call Saul, só para ver se funcionaria independentemente.

E já no começo da primeira temporada descobri que sim.

Agora, se tudo que foi demonstrado até a conclusão da terceira e mais recente temporada for algum indício, cada vez aumenta mais a sensação de que todo mundo com quem converso está certo e estou perdendo uma das melhores séries de todos os tempos ao evitar Breaking Bad. Porque Better Call Saul, um "mero derivado", já é uma das melhores séries de todos os tempos.


Como escrevi após o quinto episódio ainda da primeira temporada, "o grande trunfo aqui é o desenvolvimento de um personagem agridoce, ambíguo e divertido. Um advogado inteligente, mas que não deixa de fazer bobagens homéricas e que mesmo arquitetando golpes e trambiques ainda tem um senso moral nato, tentando racionalizar seus atos para se convencer de que faz a coisa certa."

Porém, não é só Bob Odenkirk quem brilha como o personagem-título (ou quase lá). Todo o elenco coadjuvante  merece aplausos e, sem entregar muito, os roteiristas dão aos seus personagens dimensões substanciais e verossímeis. De Mike, Kim e Chuck, passando por Howard e Francesca, até Nacho, Hector e Gus, todos protagonizam momentos tensos, engraçados, sensíveis e memoráveis dignos de protagonistas. E os personagens que são recorrentes de Breaking Bad quando roubam a cena não o fazem por serem rostos conhecidos (pois pra mim não são), mas sim por estarem servindo a um enredo engenhoso que se dá o tempo necessário para ser bem desenvolvido. Isso tudo confeccionado com uma fotografia belíssima, uma edição habilidosa e direção(ões) de altíssimo nível. É também notável como que é entregue um conteúdo maduro de qualidade, sem a necessidade de se recorrer a palavrões, nudez, sexo ou violência explícita.

A verdade é que Better Call Saul  me deixa num conflito entre perseverar ou abandonar o experimento social-artístico. O que será que Jimmy McGill aconselharia?


Better Call Saul (3a. temporada), 2017




terça-feira, 8 de agosto de 2017

Só com favas e um bom Chianti


Não que isso faça diferença alguma para ele -ou para o mundo- e nem que isso diminua seu magnífico trabalho, mas... não sei mais o que pensar de Sir. Anthony Hopkins.


Alguns trechos da entrevista que concedeu à revista Preview de Julho/17 (Ed. 94) em ocasião do lançamento do seu filme mais recente... ehrrr... Transformers: O Último Cavaleiro:

(...)

O que o senhor gosta neste filme e nesta franquia?
Eu só gosto de trabalhar. É isso.

Mas esse é o tipo de produção que o atrai?
Não, é apenas um filme bom e divertido que resolvi fazer.

(...)

Acha que tem algum filme que todos deveriam ver?
Oh, Deus, eu não sei. Eu não sei. Eu não tenho nenhum interesse neles, realmente.

O senhor assiste a filmes frequentemente ou séries de TV?
Não.

Mas assiste aos filmes e seriados em que trabalha?
Não. Se eu fiz, está feito e acabou.

Gosta de ir ao cinema?
Não. Só assisto na televisão a clássicos e filmes antigos.

Quem foi o melhor diretor com quem trabalhou?
Acho que Michael Bay é um dos melhores junto com Spielberg e Oliver Stone.

(...)

Ele tem 80 anos de idade, 50 de carreira. Quem sou eu pra pensar qualquer coisa...

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

Wolverine cansado (e cansativo)


Quase não assisti a Logan.

Após o fraco X-Men: O Confronto Final ainda arrisquei o péssimo X-Men Origens: Wolverine antes de abandonar os heróis mutantes. Mesmo com as boas recomendações de Primeira Classe e Dias de um Futuro Esquecido, não animei de retomar a franquia. Então surgiu a aclamação de público e crítica a Logan e ficou a sensação de que eu poderia estar perdendo algo especial.

Por ser em teoria um filme solo que não dependia diretamente dos que vieram antes, resolvi assistir. E descobri que não estava perdendo nada especial.


A exemplo do recente e também superestimado Deadpool, a comoção e a expectativa em torno de Logan pareciam se sustentar no fato de que a dobradinha Fox-Marvel estava lançando (mais) um filme de super-herói direcionado para adultos. O problema é que o filme parece fazer questão de usar isso como ferramenta de promoção e não por demanda de desenvolvimento narrativo.  Abrindo de cara com um Wolverine exclamando "f**k" e tendo uma cena em que uma moça gratuitamente mostra seus seios para o herói, o longa parece um amontoado de artifícios para gritar "vejam como sou um filme diferente!".

Se a surpresa da violência exacerbada por um momento traz um senso de "tudo pode acontecer", rapidamente ela se torna previsível virando um "tudo vai acontecer". E a produção se transforma em um exercício de paciência, uma espera pelo esperado.

Hugh Jackman e Patrick Stewart, que não contribuíram com suas declarações de antes do lançamento do filme sobre seus envolvimentos futuros com a franquia, até fazem um bom trabalho,  juntamente com a surpreendente novata Dafne Keen. O diretor James Mangold acerta no clima de faroeste, mas erra ao escancarar suas influências com uma cena em que personagens assistem a Os Brutos Também Amam, que acaba sendo referenciado mais para o final, com pouquíssimo efeito dramático.

Logan poderia até ter sido um filme melhor, se não ficasse ocupado em pontuar que possui crianças assassinas e que Wolverine fala, sim, palavrões e tem o costume de repetidamente usar suas garras para atravessar os crânios dos vilões. De certa forma é um alívio que o filme ganhe classificação de censura como inadequado para menores, não somente pelos motivos óbvios, mas principalmente por seu cenário soturno, onde os X-Men estão mortos (aparentemente por decorrência de uma doença mental do próprio Professor X) e os heróis remanescentes estão decadentes e sequer conseguem salvar e se importar com uma família que os acolhe.

No mundo atual, já suficientemente amargurado, não é nada disso que queremos de um filme de herói.


Logan (Logan),2017