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quarta-feira, 25 de novembro de 2020

O terror sem comédia, o terror meio comédia e a comédia em meio ao terror


O diretor-roteirista Remi Weekes consegue um feito difícil em seu longa de estreia, O Que Ficou Para Trás: juntar dois gêneros e conseguir extrair o melhor que cada um tem a oferecer. O drama de um casal de refugiados em sua "nova vida" é tratado com sensibilidade e relevância enquanto o terror de casa mal-assombrada traz bons sustos e funciona bem no nível metafórico, como todo terror que se preze. Entre os horrores sobrenaturais e os bem reais, há um ponto de virada que fortalece a construção dos personagens e da narrativa enquanto dá um soco no estômago do espectador. Angustiante e implacável, o filme é uma bela empreitada, embora não seja bonito de assistir. 

O Que Ficou Para Trás (His House), 2020




Dosado em quantidades quase homogêneas de terror, comédia e mistério, O Lobo de Snow Hollow é um filme peculiar, que ainda acha espaço suficiente para humanizar a trama com drama pessoal. Funciona curiosamente bem, mesmo que a atuação de Jim Cummings (que assina também a direção e o roteiro) seja confusa, não raramente deixando um borrão no tom das cenas ao transitar entre o admirável e o exagerado sem cerimônia (e, provavelmente, sem intenção).

O Lobo de Snow Hollow (The Wolf of Snow Hollow), 2020




Distante física e emocionalmente, e com pouquíssimo conhecimento de causa, é muito difícil avaliar um filme que usa o conflito entre Israel e Palestina como comédia. Pode ser que Tel Aviv em Chamas esteja dando uma roupagem muito suave e feliz para algo muito sério e que foi/é causa de sofrimento de milhares, sem gerar o efeito de protesto ou exposição típico do humor (especialmente o satírico). Pode ser também que a produção seja tendenciosa. Na minha ignorância, desfruto dessa deliciosa historieta pelos personagens carismáticos e fico apenas feliz de ver que pode ter algo de ingênuo e de esperançoso no dia-a-dia dos que vivem na região, algo além do que nos é bombardeado (perdão do trocadilho) nos noticiários.

Tel Aviv em Chamas (Tel Aviv on Fire), 2019




quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Se não der, tenet outra vez

Mesmo cheio de expectativa, afinal era o novo e ambicioso (como dizia a mídia) filme de Christopher Nolan, cheguei a cogitar esperar Tenet sair em streaming, em vez de enfrentar os riscos de uma sala de cinema. Confiante nos protocolos e determinado nos devidos cuidados, não me arrependi de ter arriscado a desfrutar do filme na tela grande. E com aquele som todo.

Se tem algo inegável nos filmes de Nolan é como eles são cinematográficos e, assim, providos de um visual impressionante e um áudio marcante (mesmo que possa ser acusado de "alto demais"). E em Tenet o diretor parece ter chegado ao seu ápice nesses quesitos, materializando de forma sensorial ideias elaboradas em um filme de ação.

Só que ao contrário de produções como Amnésia, O Grande Truque, A Origem e Interestelar, e mais na linha do recente Dunkirk, Tenet não traz muito além do "sentir e se deslumbrar", deixando pouco para o "analisar e discutir". A complexidade da premissa é executada magistralmente em imagens, mas deixa a desejar nos âmbitos intelectual e emocional. 

Entre um roteiro muitas vezes confuso, que não passa clareza no quê e como está de fato em jogo, e personagens superficiais (o protagonista ser creditado como O Protagonista é sintomático), fica difícil se engajar plenamente com o longa. Certa vez, ouvi que o que faltava em A Origem era uma ameaça maior, algo de escala mundial, em vez de "simplesmente aquela história de competição corporativa". Pois bem, onde A Origem consegue criar um vínculo com o público e prendê-lo emocionalmente não é no objetivo da missão secreta do Cobb de DiCaprio, mas na carga de culpa do seu passado com sua esposa e, principalmente, na tensão de se ele vai conseguir rever os seus filhos. Tenet, infelizmente, não tem nada disto e simplesmente assume que conquistará o espectador só de anunciar que o que está em risco é uma terceira guerra mundial (e depois, pior, o fim do mundo).

De qualquer forma, o longa é o mais inventivo do ano e essencial para qualquer fã de cinema. Afirmar que não figura entre os cinco melhores da carreira do cineasta britânico é tão verdadeiro quanto desleal. Ao realizar algumas das obras-primas da história da sétima arte, Nolan também gerou, com a expectativa de se superar, o fantasma de alcançar o, talvez, inatingível.


Tenet (idem), 2020




sexta-feira, 6 de novembro de 2020

Comédias em crise existencial (e sem título em português)


On the Rocks é um filme de Sophia Coppola em que uma mulher está em crise existencial com o trabalho e tem dúvidas sobre seu relacionamento amoroso. Sua busca para reencontrar sentido na vida é em companhia de Bill Murray numa megalópole que, mesmo lotada de pessoas, a faz se sentir sozinha e isolada. Exatamente como Encontros e Desencontros, só que numa versão (ainda mais) rasa para um drama e sem graça demais para uma comédia. A distração despretensiosa é garantida pelas 'murrayzadas', mas o resto que acaba sobrando é dispensável.

On the Rocks (idem), 2020





Excêntrica e, por vezes, puramente surreal, Kajillionaire é uma comédia sobre uma família de trapaceiros em dificuldades materiais, cuja jovem filha única passa por um despertar emocional. Alternando entre o bizarro e o sentimental, a diretora-roteirista Miranda July mostra um filme com coração e arranca uma risada aqui e ali, mas agrada somente aqueles que estão abertos a abraçar o não-convencional.

Kajillionaire (idem), 2020




Numa mescla de autobiografia com ficção, a outrora promissora escritora teatral Radha Blank apresenta como diretora, roteirista e atriz em The Forty-Year-Old Version a chegada aos 40 anos de idade com uma carreira longe de ter alcançado seu potencial. Claro que se trata de uma história de amadurecimento e de reinvenção independente da idade, e o humor de comédia predomina, mas o tema e a opção pela fotografia em preto-e-branco embebem o filme em melancolia.

The Forty-Year-Old Version (idem), 2020